A inteligência artificial será superior à inteligência humana?

medico neurologista em botafogo

A etimologia da palavra inteligência tem sua origem no latim “intelligentia” derivada do verbo “intelligere”, que significa, perceber, entender, discernir, é formado pela junção de duas partes “inter” que significa “entre” e “legere” que significa “escolher”, portanto, o conceito inteligência está relacionada a capacidade de escolha entre possibilidades. Em termos biológicos todos os organismos vivos fazem “escolhas” para se adaptarem ao ambiente e otimizarem sua sobrevivência. As plantas podem perceber informações do meio ambiente através de seus fotorreceptores, como o caso do girassol que “rastreia” a luz solar e move suas flores ao longo do dia para acompanhar o sol. As abelhas de forma coletiva constroem colmeias hexagonais que é uma forma eficiente de utilizar espaço. Os cães aprendem e obedecem a comandos para receber comida que é uma forma da adaptação da sua domesticação com o ser humano. Quase todos os organismos vivos optam em direção a manutenção e otimização da sua vida de forma automática através de estímulos adaptativos como nas plantas ou instintivas como nos animais, com exceção do ser humano que não é automático e sim volitivo e conceitual. 

Consciência volitiva significa que o ser humano se difere de todas as outras espécies de animais por poder escolher como pensar e o que pensar, isso implica no que denominamos livre arbítrio. Conceitual significa a maneira que o ser humano armazena e condensa o conhecimento, este processo cognitivo se inicia na formação dos conceitos universais retidos em nossa cognição em forma de palavras (ex: homem, justiça, politica). A formação dos conceitos segundo Ayn Rand consiste em isolar mentalmente duas ou mais existentes por meio de suas características diferenciadoras e reter esta enquanto omite-se suas medidas em particulares, com base no principio de que essas medidas devem existir em qualquer quantidade, então um conceito é uma integração mental  de duas ou mais unidades que possuem em comum características, com suas medidas particulares omitidas. A cognição humana para formar o pensamento humano organiza os conceitos em forma de proposições (ex: o homem é mortal) e em princípios (ex: dois corpos massivos se atraem). 

A inteligência humana é a mais eficiente e mais complexa de todos os organismos vivos, é a que mais consegue discernir, diferenciar, integrar e compreender. Estruturalmente, isto é, possível porque o sistema nervoso central humano, o cérebro, é o mais sofisticado dentre todos os animais. O cérebro humano tem 86 bilhões de neurônios, o terceiro no reino animal, em termos quantitativos, atrás do elefante africano com 257 bilhões e da baleia com 200 bilhões neurônios, mas é o ser humano que possui mais neurônios do córtex cerebral, que são  neurônios especializados na cognição, 16 bilhões em comparação com os 5,6 bilhões do elefante africano e 3 bilhões das baleias. É claro que existem ainda inúmeros aspectos do cérebro humano que justifiquem a sua inteligência superior em relação a outros animais como organização, conectividade e neuroplasticidade.

O ser humano pode adquirir conhecimento, isso significa que ele pode expandir sua inteligência de maneira exponencial, o que não ocorre com outros organismos vivos. A fonte de todo o conhecimento humano, vem da existência, ou seja, da realidade, o ser humano capta através dos seus sentidos (visão, audição, tato, olfato e paladar) informações das existentes e através de mecanismos ativo de diferenciação e integração na forma os conceitos universais. De acordo com Ayn Rand, a base de todo o conhecimento do homem é o nível perceptual de ciência. É na forma de “percepções” que o homem assimila a evidência de seus sentidos e aprende a realidade. O material de construção do seu conhecimento é o conceito de “existente”, que é implícito em toda a percepção. 

Há pelo menos V séculos antes de Cristo,  Parmênides (515 a.C. – 445 a.C) já apontava que a existência é a base do conhecimento: “O ser é, e o não-ser não é”, ou seja, a base absoluta do conhecimento é aquilo que existe, o que não existe, não pode ser conhecido, portanto, o conhecimento é o reconhecimento do que existe.

O conhecimento humano não é um fim em si mesmo, o valor do conhecimento, está na sua aplicação, em ultima instância, guiar as ações do homem para a sua sobrevivência no curto, médio e longo prazo. O conhecimento é um todo integrado não pedaços isolados, por exemplo, princípios são verdades fundamentais que servem para determinado domínio (ex: as estrelas controlam as orbitas dos planetas). O conhecimento em forma de princípios nos facilita o entendimento e a nossa ação naquele determinado domínio do principio. O principio é uma abstração (conhecimento) derivado da observação e integração dos fatos da realidade. O método racional de se descobrir um principio é método racional indutivo que se estabelece um principio a partir da observação de casos concretos e particulares. A partir da descoberta de um principio pelo método indutivo, se utiliza do método racional dedutivo que parte do geral, o principio, para o particular no concreto específico. 

Diferente do ser humano a inteligência artificial não tem vida, por isso não tem consciência e em consequência não tem ciência da existência, ela recebe dados indiretos, representações parciais da realidade (ex: texto, imagens, áudio, vídeos), a partir daí, os algoritmos, analisa e processa dados que geram padrões, cálculos e probabilidades estatísticas, inevitavelmente reproduzirá informações inválidas e distorcidas, ela pode ser factualmente incorreto, mesmo que ela esteja funcionando corretamente com base nos dados fornecidos, além disso o conhecimento do ser humano é como um todo integrado, aonde conexões causais podem ser descobertas em um contexto supostamente diferentes, por exemplo, Newton, no século XVII, formulou os princípios da gravitação universal e do movimento e unificou a astronomia com a física o que hoje é denominado de astrofísica. 

Outro aspecto importante é que a vida, gera o conceito valor, a qual depende de duas perguntas primárias: Valor para quem e para que? A resposta para o próprio organismo e para o sustento e manutenção da sua própria vida. Não existe valor para uma pedra, mas a pedra pode ter valor para o ser humano.  A resposta automática de valores para o ser humano são as emoções, se algo vai a favor de seus valores a satisfação (ex: alegria ), se ao contrário, é a insatisfação (ex: tristeza ). As emoções são motivadores automáticos de intencionalidade, que dependem da nossa habilidade cognitiva de buscar e perseguir valores.

Para a inteligência artificial não existe valor, por isso não tem intencionalidade, não tem o valor do conhecimento, para a vida, não têm o estímulo para fazer tarefas novas, sem treinamento prévio, em um contexto completamente diferente.  O ser humano tem intencionalidade, uma inteligência geral, a qual denominamos razão e bom senso. A razão humana é volitiva, nós escolhemos quais pensamentos, abstrações, devemos seguir, porque temos a autoconsciência do nosso próprio processo mental de escolhas. Já a inteligência artificial não tem consciência, não tem inteligência sobre seu processo de decisão.

A inteligência artificial pode ser imbatível em tarefas específicas, em sistemas fechados, sob domínios específicos, por exemplo jogar xadrez, mas essa mesma máquina não conseguiria, se tivesse um corpo, sair sozinha na rua em segurança sem ser enganada ou roubada, ela tem sua utilidade na vida humana, no entanto, somente o homem tem acesso a existência,  que é a base de todo o conhecimento, aonde é a prova de tudo, da falsidade ou veracidade, de uma afirmação ou negação. Em última instância o oráculo do conhecimento sempre será o ser humano em relação a inteligência artificial. 

Autor: Rafael Higashi, médico (52.74345-3) , mestre em medicina, neurologista (RQE: 13728) e nutrólogo (RQE:19627) da Clínica Higashi Rio de Janeiro e Londrina.

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