O tabagismo é responsável por mais de 8 milhões de mortes anualmente em todo o mundo, enquanto cerca de 1,2 milhão de pessoas são não-fumantes expostas ao fumo passivo. A pandemia de COVID-19 levou milhões de usuários de tabaco a quererem parar de fumar. Com isso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou uma campanha mundial intitulada “Comprometa-se a parar de fumar durante a COVID-19” com início em 08 dezembro 2020 e duração de 01 ano, ou seja, vai até dezembro de 2021. O Brasil é um dos países em foco nesta campanha, juntamente com Alemanha, Estados Unidos, Rússia, China entre outros. Esta campanha apoiará pelo menos 100 milhões de pessoas em uma tentativa de parar de fumar (1). 

No Brasil, 428 pessoas morrem por dia por causa da dependência a nicotina, são 156.216 mortes anuais que poderiam ser evitadas. O tabagismo é o responsável por desenvolver câncer (de pulmão e outros tipos), doença cardíaca, acidente vascular cerebral (AVC), doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), pneumonia (4). 

O tabagismo é classificado como uma doença crônica, que é causada pela dependência química da nicotina, presente em produtos à base de tabaco (cigarro, charuto, cachimbo, cigarro de palha, cigarrilha, bidi, tabaco para narguilé, rapé, fumo-de-rolo e outros). De acordo com a Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), o tabagismo integra o grupo de transtornos mentais e comportamentais, em razão do uso de substância psicoativa (nicotina/tabaco) (3-4).

 

Estudos sobre comorbidades entre tabagismo e transtornos mentais, tais como depressão e ansiedade. A probabilidade de abandono do tabagismo é reduzida em pacientes com transtornos mentais comuns, tais como: ansiedade e depressão. Os fumantes com histórico de transtornos mentais correm mais risco de recaídas durante o período de abstinência, em comparação aos fumantes sem o mesmo histórico. O cigarro nesses casos pode ter sido usado para o alívio de sentimentos de nervosismo, tristeza, ou oscilações de humor. Há evidências que o uso de nicotina interfere nos sistemas neuroquímicos, o que, afeta circuitos neurais, tais como mecanismos reforçadores associados à regulação de humor (6). 

O tabagismo é uma doença cujo controle deve ser feito com distintas abordagens, que se integram: farmacológicas, psicológicas, de comunicação de massa, econômicas, entre outras (7).

Entretanto, os tratamentos atuais para o tabagismo muitas vezes podem não ser eficazes para a maioria dos fumantes.  Cerca de 780 milhões de pessoas no mundo dizem querer parar de fumar, mas apenas 30% delas têm acesso às ferramentas que podem ajudá-las a fazer isso (1). E cerca de 62% dos fumantes na tentativa de parar de fumar por conta própria e sem farmacoterapia, tiveram uma recaída nas primeiras duas semanas e apenas 5% conseguiram parar de fumar após um ano (2). 

Os métodos para tratamento do tabagismo, podem ser feitos com: mudança de hábitos de vida; aconselhamento; psicoterapia; reposição de nicotina com: goma de  mascar ou pastilhas, adesivo transdérmico, inaladores e medicação oral. Estes métodos podem ser combinados e aumentar ainda mais o sucesso no tratamento, porém muitos fumantes que usam esses métodos e não conseguem parar de fumar e manter a abstinência por pelo menos 6 meses.

Dentre os tipos de tratamentos para tabagismo, o aconselhamento pode ser realizado individualmente ou em grupo, sendo geralmente conduzido por profissional treinado. O tratamento em grupo usa das mesmas técnicas que o individual, porém, há diferentes vantagens entre eles. A vantagem do tratamento em grupo é um maior suporte social, que favorece a troca e a partilha vivenciadas no grupo, bem como a identificação de fatores de risco. Já as vantagens do tratamento individual possibilitam maior atenção e tratamento personalizado. A terapia cognitivo comportamental (TCC) é bastante utilizada. A TCC procura auxiliar o fumante a identificar os desejos e gatilhos do ato de fumar, com a utilização de técnicas cognitivas e de modificação do comportamento para interromper a associação entre o desejo, a situação gatilho, ou seja, trabalha justamente no comportamento da fissura de fumar e ao comportamento de consumo do cigarro. Assim que a abstinência ocorre, são usadas técnicas de prevenção de recaída. Independente do tipo de tratamento proposto, o apoio social é um fator importante para o tratamento do tabagismo, inclusive boa parte dos programas de tratamento oferecem algum tipo de apoio (7).

Dentre das novas abordagens, podemos destacar a neuromodulação cerebral não invasiva, pela qual  pode utilizar-se de  uma equipamento chamado de  Estimulação Transcraniaca de Corrente Continua (ETCC). Esta técnica utiliza-se da tecnologia para regular a atividade elétrica e química do sistema nervoso central. A Estimulação Transcraniana de Corrente Continua (ETCC) é uma técnica de estimulação cerebral não invasiva com efeito de induzir alterações da excitabilidade cortical. São utilizados 2 eletrodos (anodo e catodo), que colocados em diferentes posições no couro cabeludo e ligados a um equipamento específico, criam um fluxo de corrente elétrica, contínua e de baixa voltagem (baixa intensidade) que atinge o córtex cerebral de forma focal. Apesar da aplicação ser focal, os efeitos atingem área corticais adjacentes e distantes da região alvo estimulada, podendo ainda atingir área profundas. As montagens podem ser monopolares ou bipolares, ou seja, na montagem bipolar ambos os eletrodos se encontram sobre a área cefálica em que os efeitos dos estímulos se localizam. As vantagens do uso desta técnica são: não invasiva, poucos efeitos colaterais, alta tolerabilidade, eficácia de resultados. Nos últimos anos, a ETCC tem se mostrado um método de tratamento seguro, não invasivo para restabelecer o funcionamento cerebral e pesquisas estão sendo realizadas para a redução da fissura do fumo, capacidade de resistir ao fumo, redução da vontade de fumar  durante à noite e motivar os fumantes a pararem de fumar.

The Perth Brain Centre – Estimulação Transcraniana de Corrente Continua (ETCC).
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Um estudo randomizado foi realizado com o objetivo de examinar a eficácia da estimulação transcraniana da corrente contínua (ETCC) no tratamento do tabagismo. Neste estudo 170 participantes fumantes, todos com interesse em parar de fumar, idades entre 21 e 64 anos, sem comprometimentos físicos ou psicológicos. A gravidade da dependência do tabaco/nicotina foi avaliada através do teste de Fargerstrom e consumo de cigarros diários autorreferidos.  Os participantes foram divididos aleatoriamente em grupos que foram submetidos a tratamento medicamentoso (com cloridrato de bupropriona) ou foram submetidos a 20 sessões de ETCC. O resultado do estudo mostrou que a ETCC com 20 sessões em 12 semanas teve um efeito significativo na cessação do hábito de fumar e no controle da dependência, com taxas de abstinência de 6 meses de 25,7%, confirmado por teste da nicotina salivar (<4 ng / ml), mostrando-se assim como um possível método de tratamento. Um dos aspectos importantes desse tratamento é de melhora cognitiva, pois possibilita um melhor autocontrole da fissura por fumar, com resultados a médio e longo prazo.

Equipe  Clínica Higashi

Referências:

  1. Organização Mundial da Saúde (OMS). Site: https://www.paho.org/pt/noticias/8-12-2020-oms-lanca-campanha-um-ano-para-ajudar-100-milhoes-pessoas-pararem-fumar
  2. HAUERA, L; SCARANOB, I. G.; BRIGOC,D. F.;  GOLASZEWSKIE,F S.; LOCHNERG, P.; , TRINKAE E.; SELLNERE,J. & NARDONE, R. Effects of repetitive transcranial magnetic stimulation on nicotine consumption and craving: A systematic review. Elsevier. Psychiatry Research vol. 281 (0165-1781). 2019 https://doi.org/10.1016/j.psychres.2019.112562
  3. BRASIL. Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças  e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10 – 1997). Site:  http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=060203
  4. Instituto Nacional do Câncer (INCA). Site: https://www.inca.gov.br/es/node/1797
  5. PINTO, M; BARDACH, A; PALACIOS, A; BIZ, A; ALCATRAZ, A; RODRIGUEZ, B; AUGUSTOVSKI, F; PICHON-RIVIERI, A. Carga de doença atribuível ao uso do tabaco no Brasil e potencial impacto do aumento de preços por meio de impostos. Documento técnico IECS N° 21. Instituto de Efectividad Clínica y Sanitaria, Buenos Aires, Argentina. Maio de 2017. Site: www.iecs.org.ar/tabaco.
  6. REGINA DE CÁSSIA RONDINAI; R.C; GORAYEBII, R; BOTELHOIII, C. Características psicológicas associadas ao comportamento de fumar tabaco Jornal Brasileiro de Pneumologia. vol.33 no.5 São Paulo Sept/Oct. 2007. Site: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132007000500016
  7. PRESMANI, S; CARNEIRO, E; GIGLIOTTIIII, A. Tratamentos não-farmacológicos para o tabagismo.  Rev. psiquiatr. clín. vol.32 no.5 São Paulo September/October 2005. Site: https://doi.org/10.1590/S0101-60832005000500004