Compreender o que são as distorções cognitivas é de fundamental importância,  porque elas podem ser a causa do sofrimento para o próprio  indivíduo, sua família e para a sociedade como um todo. Distorções cognitivas sãs crenças equivocadas, relacionada ao entendimento sobre ela mesma, sobre o mundo, sobre outras pessoas e o futuro, e  por um mecanismo de auto -reforço automático destas crenças, elas  podem se tornar tão intensas a ponto de gerar, em pessoas predispostas,  doenças neuropsiquiátricas como: depressão, ansiedade, fobia e a nível de sociedade forma de pensamento de massa , fanatismo, genocídios, pobreza, guerras e etc.

Todos nós temos a tendência a formar distorções cognitivas, porque ela é a forma de pensar mais rápida, simples e  primitiva do nosso cérebro tomar decisões,  foi desenvolvida ao longo da nossa evolução para nossa sobrevivência em tempos de “fight or flight “, luta ou fuga, um bom exemplo é o comportamento de manada, expressão derivada do comportamento animal de fuga coletiva, se a maioria esta correndo para um lado devo correr também, para evitar o perigo. Esta forma de forma de pensar pode ser útil em determinadas situações mas também pode ser prejudicial pela formação das distorções cognitiva.

Há mais de 2.000 anos dentro da filosofia grega, romana e oriental , correntes filosóficas  buscavam compreender o pensamento para viver melhor. Um famoso filósofo estoico romano Marco Aurélio Antonino , imperador romano  entre 161 até 180 d.c, escreveu em um diário : “Se alguma coisa externa lhe causa angústia, não é a coisa em si que o perturba, mas seu julgamento a respeito. E isso você tem o poder de eliminar agora” . A filosofia estoica, por exemplo, é a base do que hoje é uma das terapias não medicamentosas mais validados em termos científicos , a Terapia Cognitivo-Comportamental, que é a  terapia que estuda a cognição individual para compreender as emoções, o comportamento e as respostas fisiológicas, ou seja, compreender as distorções cognitivas para posterior equilíbrio emocional e  comportamento funcional.

Marco Aurélio Antonino, imperador romano e filósofo (121 – 180 d.c)

Daniel Kahneman, doutor em psicologia e prêmio Nobel de Economia em 2002, explica em seu livro “Rápido e Devagar” duas formas de pensar. Basicamente ele divide nossa forma de pensar em dois sistemas: o 1º denominado de intuitivo e o 2º de racional .

O 1º sistema (intuitivo) é rápido e produz respostas quase instantâneas , sendo inclinado a acreditar e confirmar, concentra-se nas evidências e ignora a falta delas, sendo o que você vê é tudo o que existe; é praticamente involuntário e é base para a maioria das nossas decisões. Graças a esse sistema algumas atividades funcionam de maneira automática, como por exemplo andar, no entanto, você pode chegar a conclusões precipitadas, cometendo erros em muitas situações. O processo de pensamento do 1º sistema calcula as perdas, ganhos, riscos e recompensas e insere as emoções nos resultados. Seja por medo, arrependimento ou para passar uma impressão de que somos especialistas, nossas emoções influenciam nossas decisões de maneira significativa. O 1º sistema possui maior conexão emocional conosco e é normalmente aquela que chama nossa atenção, é processada em estruturas cerebrais mais primitivas.

O sistema 2 (O racional) é programado para pensar, analisar, avaliar e, então, responder – enxerga os dois lados de cada negociação; exige sua total atenção para realizar a tarefa, ou seja, o Sistema 2 precisa ser chamado para agir; acalma os seus pensamentos, aumentando assim a probabilidade de pensar de forma mais precisa e apropriada. E, ainda, pensará de maneira mais eficiente, apesar de não ser totalmente livre do sentimentos, o sistema 2, não decide na emoção, ele pondera levando em consideração outos fatores e é processada em regiões cerebrais mais evoluídas no nosso neuro desenvolvimento.

Ambos, o sistema 1 (intuitivo) e  o sistema 2 (racional)  afetam nossas decisões em diversas situações, os dois sistemas podem trabalhar juntos. É o caso, por exemplo, quando você está prestando atenção extra, enquanto dirige à noite. Nosso cérebro busca o caminho mais fácil, quando somos colocados em cheque, nosso cérebro evoca o Sistema 1 que tem menor resistência. Ou seja, duvidar de algo ou simplesmente não acreditar em algo é tarefa que exige muito esforço para nosso cérebro. O Sistema 2 é acionado apenas quando você está em uma situação muito confusa ou percebe que uma crença é falsa. Ele desacelera seu processo mental e gera o pensamento analítico e o raciocínio lógico. Kahneman,  incentiva a encorajar sua mente a olhar além das influências e padrões, isto significa, observe os fatos disponíveis e ignore os sentimentos, impressões e palpites. A intuição o sistema 1 pode ser mais assertivo quando a pessoa tem muito conhecimento sobre um assunto, um neurologista, poderia reconhecer, e dar um diagnóstico, simplesmente observando, o andar do paciente -“doença de Parkinson”- em contra-partida, outro médico não especialista, poderia até arriscar o diagnóstico mas a chance de errar seria grande pela menor conhecimento e experiência no diagnostico das doenças motoras.

Vamos dar dois exemplos um no individual e outro no coletivo de como estas distorções cognitivas influenciam negativamente a vida.

O primeiro exemplo no individual: Uma criança no ensino básico que tem dificuldade para aprender a matemática, pode ter uma percepção própria negativa devido a pressão do colégio, a cobrança do país, a “chacota” dos amigos e etc… , mesmo que estas circunstâncias não foram feitas de maneira pejorativa , pode ser que a maneira que esta criança compreenda a situação, gere um pensamento do tipo : “Sou burra, não aprendo”.  Esta crença gera um sentimento de tristeza e um comportamento de evitação para aprender o novo e desinteresse de estudar, pois não quer passar pela mesma situação anterior de se sentir inferiorizada. Note que este pensamento disfuncional “ Sou burra não aprendo “ pode gerar outros pensamentos disfuncionais, quando outras situações difíceis estão ocorrendo em conjunto, por exemplo, uma separação dos pais, poderia gerar uma crença do tipo “ Nada da certo para mim, não tenho sorte”,  porque agora, ela acredita que ser burra e ter seus pais separados é uma questão de não nascer com sorte na vida, mais tarde na adolescência, uma rejeição afetiva, ocorre, que é algo normal e ocorre com todo mundo, mas está experiência a faz reforçar com grande intensidade a crença de que “ Nada da certo para mim, não tenho sorte”, enfim um grande “ caldo mental para a depressão na adolescência. Observem que acontecimentos normais da vida, dependendo de como são interpretados,  podem levar a depressão , ai está o problema do pensamento distorcido da realidade.

O segundo exemplo vamos para influência das distorções cognitivas no coletivo. O trágico holocausto pode ser um bom exemplo pois naquele momento a Alemanha sob comando do partido nazista tinha como crença de que os alemães “arianos” precisavam eliminar “as ameaças” , etnias “inferiores” , especialmente a judaica, ou então, eles próprios seriam extintos. Em 1961, Hannah Arendt  jornalista e filósofa alemã de origem judaica ,foi encarregada por uma revista americana para acompanhar acompanhar face a face o julgamento de  Eichmann em Israel;  este que foi burocrata do partido alemão nazista responsável pelo operacionalização da chamada “solução final” , que em 1941 levou o extermínio de milhares de judeus. Após estudo e reflexão Hannah publicou o livro “Eichmann em Jerusalém – Um relato sobre a banalidade do mal “ . O senso comum , naquela ocasião, era de que o nazismo era fruto de um azar histórico de vários psicopatas juntos governando um país, e Eichmann seria no mínimo um destes monstros, no entanto, para a surpresa de todos,  Hannah Arendt,  observou que Eichmann, não tinha o perfil de um psicopata , era um homem comum, um pai de família normal , um burocrata dedicado do funcionalismo publico alemão. Porque um homem comum poderia ser capaz de organizar o extermínio de  milhões de seres humanos ? Como condenar um funcionário público, honesto e obediente, cumpridor de metas, que não fizera mais do que agir conforme a ordem legal vigente da Alemanha daquela época?

Hannah Arendt (1906 – 1975) – jornalista e filósofa

O ponto central da reflexão de Hannah Arendt,  hoje considerada considerada entre as mais influentes pensadores do século XX, foi que a eliminação sistemática da faculdade de julgar, derivado da irreflexão do pensamento cotidiano, podem transformar indivíduos comuns em monstros, ou seja, poderíamos nos tornarmos monstros,  quando não refletimos nossas atitudes embora seja senso comum? Questione os seus pensamentos,  veja se existem alternativas contrárias a ele, questione as evidências que se ancoram a sua crença, observe se não existe a influência de sentimentos como medo, orgulho, raiva e egoísmo que o levam à distorção do realidade,  lembre-se que pensar como a maioria é mais fácil , dilui-se o risco de estar errado. Como dizia Sócrates: “ Uma vida sem reflexão não merece ser vivida”.

Autor: Dr. Rafael Higashi, mestre em medicina, neurologista e nutrólogo da Clinica Higashi ( www.clinicahigashi.com.br)